À beira de completar dois anos de projeto verão
(sim, tenho efeitos retardatários), reparei bastante coisa nessa vida de
gente que malha às 6 da manhã. Gente focada, gente competitiva, muita gente com
sono e sempre aquele povo me perguntando como vão os gateinhos da
cadímia. Aí eu esclareço que (realmente) tô lá pela minha saúde - sério, se
fosse diversão eu estaria fazendo ioga ou aula de dança -, que não fico lá muito fotogênica levantando pesinhos, tenho problemas de equilíbrio logo cedo e, pra ajudar a
argumentar, separei umas histórias rápidas pra comprovar o que tô dizendo aqui.
Episódio 1
É aquele dia de “treino peito-costas-bíceps-tríceps”
e você tá lá, com aquele monte de barras, pesinhos e halteres, se sentindo um
menino, com vestindo uma camiseta que diz “eu sou uma bailarina” pra ajudar a
te lembrar do contrário e tentando deixar o banco retinho de frente pro espelho
porque... Enfim...Porque sim!
Aí o moço do lado pergunta se você precisa de ajuda.
Você dá o melhor sorriso que consegue às 6 e pouco da manhã e diz que tá tudo bem, mas que se perde um pouco se o banco não
estiver alinhado com o espelho e essas loucuras todas.
E ele então responde:
- Ah, sim, eu também faço isso. Se o banco ficar um
pouquinho torto eu já me PERDO.
Pausa mental.
Você deve ter ouvido errado.
Aquele PERDO fica ali ecoando uns 3 segundos na sua cabeça.
Você precisa responder alguma coisa. Qualquer coisa.
- É... Ah, é?
- Pois é. Eu me PERDO!
(De novo)
- Me PERDO FACINHO mesmo.
(Pultz! De novo e de novo!)
Aí você comenta que “Pois é, eu me PERCO (com C!).
Me perco mesmo, me perco muito!”.
Ele continua confiante no verbo errado.
Você desiste e volta pros halteres.
Episódio 2
Dia de trabalhar as pernocas.
E lá pelo terceiro aparelho (que você nem sequer aprendeu o nome depois de quase 2 anos malhando), todo o seu esforço tá empenhado
em completar as 4 séries intensas de 10 repetições cada, tentando manter a classe e o charme na medida que o exercício permite.
Então você olha pra baixo e vê um par de tênis que chega e para mais ou menos na sua frente. Você reconhece que é o pé de um moço e vai levantando a cabeça devagar pra dar “bom dia”, porque sim, você tenta ser simpática apesar do horário.
Aí você para.
Você não é de parar para reparar nos outros. Mas você para. Porque aquele tênis ali na frente nunca foi feminino, mas as pernas que tão paradas ali são completamente lisinhas.
Então você termina de levantar a cabeça e reconhece aquele moço. Lindo, que só aparece de vez em quando, que passa mais tempo olhando o celular e ocupando os aparelhos do que efetivamente fazendo exercícios, mas lindo do mesmo jeito. E com as pernas lisinhas. Mais lisinhas do que as suas naquele dia, aliás.
É nadador, você pensa. Só pode ser.
Enquanto ele continua lá alongando, e levanta o braço, você aproveita pra reparar que ali também não tem nada.
Aí você vê as unhas. Lixadinhas e com aquele brilho de quem passou base, sabe? Enquanto você pensa que não conseguiu nem pra tirar as cutículas das suas...
É nadador, você pensa de novo. E filho de manicure, você imagina. E com um senso de vaidade que é três vezes o seu, você conclui.
Você não é a favor dos moços tipo neandertal, mas
aquela cena toda ali na frente... Enfim... Você desiste e vai correr na esteira.
Episódio 3
Você não conseguiu sair da cama quando deveria, foi
pro treino num horário diferente do seu habitual e encontrou uma amiga muito
querida que não via há um tempão acenando do outro lado daquela sala lotada que
também resolveu que só ia malhar depois do horário comercial.
Você para pra lembrar que realmente detesta aquele
lugar quando tá lotado, promete que vai acordar cedinho no dia seguinte e aí
repara que pra dizer oi pra amiga vai ter que atravessar toda uma sala cheia de
gente e aparelhos e tenta não pensar no fato de que ocasionalmente você fica
desastrada pra caramba.
Aí você passa pelo pessoal do agachamento, pelo
povo levantando barras e halteres, gente respirando fundo, gente fazendo
esforço e careta e consegue chegar ao pessoal do abdominal do outro lado sem
causar acidentes.
Mas na hora de cumprimentar a amiga, com toda a sua
pose de lady, você quase acerta um belo chute em alguém que tá passando bem
atrás de você na mesma hora.
Você fica vermelha, laranja, roxa de vergonha,
acelera o papo e sai pra pedir desculpas pro cidadão que você quase acidentou.
Você se aproxima dele, que tá lá levantando pesinhos bem pesados, pede licença
e se desculpa.
Ele olha pra você e responde feliz da vida:
- Ui, foi nada, boba! Imagina!
Você sorri e vai treinar.
Episódio 4
Mas eis que um belo dia um moço muito interessante
na academia resolve te dar bom dia.
Você até acha que este último episódio vai virar um
texto da série Driblando Murphy...
Aí o bebedouro fica descontrolado, esguicha na sua
cara com toda a vontade e quando você finalmente se vira, com a boca cheia de
água e o resto do rosto também, tudo o que consegue fazer é algo parecido com
uma imitação de um baiacu.
Nessas o moço passa pra beber água também.
Você termina de engolir, manda um bom dia
retardatário meio pelas costas e sai, enquanto o bebedouro volta a se comportar
normalmente.
Chego à conclusão de que Murphy é ciumento...